domingo, 18 de janeiro de 2009


Susan Seddon Boulet, Cancer

Antes de amanheçer

Trovoada ressonante,
sangue flutuante
leva-me para dentro de água
junto das magnéticas ondas do crepúsculo ao teu abraço
e ao teu abraço
me junto em ti sobre cavalos ferozes
correndo freneticamente
balançando à tua canção
azuis às riscas brancas
galopando velozmente calma a noite
e são os nossos corações
aqueles que batem 3/4
compassadas longas, efémeras
uma dança de pigmentos
delirium.
Acidentalmente desaba-se em nós o beijo
disseminando pequenas partículas de ar
aquelas que nos tiram o fôlego
abafando-nos, diluindo-nos em líquido
viçoso cantando aos rodopios
olhando-nos no alto da colina
trancando o sol às montanhas
do outro lado do mundo
para que este não nasça
e me leve de volta para o recomeço dos dias
sem sal
ludibriando-me dos teus olhos.

Catarina Miranda

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Amores Antigo

Reluziram em sol poente
numa noite em pó de uma ampulheta
tranfigurando-me o rosto
aquele que, transcendentemente,
eram vosso encosto.

Desfizeram-me a cama de cetim
e os meus cabelos entrelaçados
deitaram-me no mais fundo dos lençois
e perdida reencontraste-me.

Ah! Eram águas deitadas ao oceano
Jamais as buscarei
Levai-as contigo,
meus amores antigo,
de tanto colectivo
ascendendo a meus pés.


Catarina Miranda

domingo, 11 de janeiro de 2009

Vem de mansinho

Serei a manhã dos teus braços
a flor do canto da tua ternura
seguirei o trilho manso dos teus passos
fazer-me-ei dos teus olhos a paisagem,
sopro duma brisa de emoção!
Utopia do meu coração.

Vem de mansinho
enquanto gira esta loucura imensa de te amar!
De ser rainha do teu sorriso
olhando sempre o incerto paraíso
na esperança de te ver perto de mim.

Catarina Miranda

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Reencontro

Disseste que te sentias perdido
ajeitei o meu vestido
e fui à procura da tua casa.


Eram vastos os campos de searas que nos rodeavam, Artur, que me seguias pelo meu rasto de desmaios. Saltitavas, cantando as canções da nossa terra, não sabias, mas eu sorria ouvindo-te encantada.
Procurava desesperadamente por uma luz, algo para além do nosso candeeiro a óleo que crescia à medida que o sol se punha.
Não havia Lua nessa noite e a avó Mia não tinha vivido o tempo suficiente para me ter ensinado como encontrar os pontos cardeais nas estrelas. Apenas searas a imensidão e finalmente também eu me senti perdida.
"Sentes-te diferente, Artur?"
"Não, estou o mesmo"
"Acho que sei agora como é estar perdida, querido, há quanto tempo portas esta sensação?"
"Pois...não me lembro"
Há quanto tempo? Seria a única a oferecer-me para te encontrares?
E agora que estava perdida, quem viria para me encontrar?
Quem viria para me fazer encontrar e livrar-me da perda de casa interior.
No fundo do meu íntimo adorei a sensação...e deixei-me ficar, afagando-te os cabelos, reconfortando-te com as palavras doces que atenuavam o medo fictício balançando no céu.
No meio do nosso sono deixei arder o candeeiro, que enlouquecia com o vento desistindo até morrer.
Ao amanhecer renasci, como era possível? Artur, tu e eu perdemo-nos ao lado da nossa casa. Como foi real? ahhh não foi real.
Tu não acordas-te pois não estavas lá, mas no meu sonho, ensinaste-me como estar perdida tão perto do reencontro.
Desta vez acordara mais em casa do que nunca, afinal a minha tentativa de te resgatar foi em vão, todo esse sonho foi em volta do reencontro comigo mesma, pois a tua casa era na minha imaginação.

Catarina Miranda

Branco

Eu não sei bem porque pinto
O que trago só comigo,
Nem atino porque minto
Quando sinto o que não digo!

Quando o branco chove
nas tapeçarias em bulício
e me amansa o olhar
em ecos de uma lírica aventura.

Luz errante que me consome
flor nupcial faminta perfumada
Sou neve transvazando nas tuas mãos
Derretendo em mel, frémito da vida.

Oh e eu nem atino porque minto
Quando sinto o que não digo!

Catarina Miranda

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Carolie

Querida Carolie,

como tens passado este Inverno?
Aposto que quente, como tudo o que sentes.
O frio não te abala minha Carolie, tanto precisava desse teu dom agora, que os meus pés estão descalços e no meu peito não jaz um cachecol.
Pensei tantas vezes em fugir, que tem sido de vez, embora a estrutura do meu corpo seja frágil e não aguenta os ventos polares...uii pareço uma vela de um navio, branca, como sempre fui. Ainda te lembras da cor da minha pele? "Blanc Lune, Blac Lune" - chamavas-me tu, com a tua voz rouca e esganiçada! ahah mas quente, Carolie, sempre quente a tua essência!
Mais uma vez me esqueci do teu dia de anos...perdoa-me pois eu própria esqueço-me do meu, a minha cabeça de lua (não de vento) carece de fantasia e imaginação que nunca sei distinguir a realidade do que sonho. Tenho vivido entre estes dois mundos, e tenho morrido aos poucos uma vez em cada dimensão.
Espero ansiosamente pela Lua cheia para renascer um pouco mais de novo e talvez nesse dia te possa visualizar na minha mente e transmitir-te entre as tuas quimeras a minha saudade.
Sempre forte, minha Carolie, como as montanhas da nossa cidade. Ainda te lembras do Alvão? "Vien ici, Blanc Lune! Voir toutes ces fleurs" a tua voz ainda ecoa na minha imaginação, as tuas pernas correndo o verde e os teus olhos o azul. Aqueles suspiros de alegria e de concretização emocional rodopiando vale fora ao som de passarinhos e rio. Abraçava-te como uma mãe, Carolie, como uma mãe que nunca tiveste, sinto falta do teu corpo enroscado no meu à procura de protecção e afagava-te os cabelos lisos, negros, leves, quentes, como uma filha que traz consigo a força que eu tive, um dia.
Ainda tens guardado ao teu pescoço a fada do Etéreo? Eu ainda tenho guardado no meu coração a tua face e um pouco da tua alma.

Um beijo, Catherine de Lune

domingo, 4 de janeiro de 2009

Às Vezes

E por mais que eu me drogue de solidão
por mais que eu me esconda no vazio
por mais que eu goze o vácuo
por mais que ecoe
por mais que morra
uma vez de cada vez

eu não me importava, meu bem, de gastar o meu pouco longo tempo contigo,
às vezes, às vezes...

Catarina Miranda

sábado, 3 de janeiro de 2009

"Avant tout, les artistes sont des hommes qui veulent devenir inhumains."

Nocturne

Le ciel nocturne et bas s'éblouit de la ville
Et mon cœur bat d'amour à l'unisson des vies
Qui animent la ville au-dessous des grands cieux
Et l'allument le soir sans étonner nos yeux

Les rues ont ébloui le ciel de leurs lumières
Et l'esprit éternel n'est que par la matière
Et l'amour est humain et ne vit qu'en nos vies
L'amour cet éternel qui meurt inassouvi


Guillaume Apollinaire (1880 - 1918)